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A mostrar mensagens de 2013

2013 ou 2014

Hoje é o penúltimo dia do ano. Esse facto singular deixa-me amarga e nostálgica. Não que 2013 tenha sido um ano que eu goste de recordar. De facto, não há nada de bom que me ocorra deste ano. Foi um ano mau. E não é que eu seja muito apologista da expressão ''ano novo, vida nova'', mas espero honestamente que assim que derem as doze badaladas eu tenha direito a um novo começo. Detesto esta época. Fico sempre com a sensação que o ano escorreu-me pelos dedos e que acabei por não fazer nada de destaque, nada que marcasse o mundo. Detesto ter que rever o ano por inteiro, ver o que pode ser melhor. Tudo pode ser melhor. Foi um ano bárbaro. Espero, então, que assim que o relógio marcar a meia-noite, eu tenha um novo começo, outra vez. Um começo livre e doce, divertido e feliz. Espero que seja um ano para mim, em que eu não esteja agarrada a prisões convencionais ou a outro qualquer tipo de pessoa. Que seja um ano em que eu prospere e conquiste. Porque este ano, este miserá...

Presentes

Querido Pai Natal, A tempestade tolda a festa, a alegria, a felicidade, o calor da lareira, os chapéus vermelhos, as músicas antiquíssimas de Natal. Lá fora a chuva já parou, mas o vento e o céu negro ameaçam explodir. Pergunto-me se é uma forma de castigar o mundo e os seres humanos por serem como são, por todos os males feitos. Pergunto-me se não o merecemos. Mas o ''jingle bells'' ressoa pela minha casa. E eu, de peito leve e sorriso doce, sinto-me uma menina outra vez, a contar as horas para a chegada da meia noite. Neste momento falta 3 horas e meia. Anseio por essa hora mágica em que todos os meus desejos se tornarão realidade só porque um velho de barbas brancas virá trazer os meus presentes. Gostaria de conseguir escrever maravilhosos textos sobre esta época. Ou então de escrever maravilhosos textos a criticar esta época. Mas creio que já toda a gente o fez, milhões e milhões de vezes. Todos sabemos o que significa, o que é, porque o é. Portanto, chega. Quer...

A Cura

Dei por mim, mais uma vez, a fitar fotografias antigas. Perguntei-me porquê que as pessoas tiravam fotografias, porquê que queriam ou guardavam recordações. Seria para que conseguissem ver quão diferentes eram naquela altura? Quão felizes ou infelizes eram? Seria para os relembrar de vidas inteiras que viveram, para imaginarem como seriam se tivessem feito uma outra escolha de outra maneira? Seria para recordar tempos felizes? Perguntei-me se não seria melhor abandonar tudo isso. Se não seria melhor deixar os fantasmas do passado onde eles pertencem, se não seria melhor esquecer tudo o que se sabe que não volta. Pergunto-me se o ser humano é alguma vez inteiramente capaz de o fazer, de virar costas ao que era e enfrentar o que é. E pergunto-me como, sem eu me aperceber, fui capaz de fazer tudo isso. Como fui capaz de esquecer-me do passado por tempo o suficiente para que o aceitasse como passado. É tudo tão diferente do que era naqueles meses em que eu julgara que era feliz. Naquele...

Estupidificação

As gotas suaves da chuva assombram o exterior e escorrem pela janela da torre mais alta do meu palácio suburbano. Estou encostada a uma almofada com o computador no colo, sem ideia mínima do que fazer. A frustração criou-se em mim sem esforço, frustração essa que, creio eu, é apenas o reflexo do meu tédio e do meu desejo de estar para sempre entediada. Entrei numa hibernação emocional. O inverno faz-me sorrir e esperar, mas a minha vontade neste momento não é essa. A minha vontade não é mais nenhuma a não ser poder deitar-me e não acordar por meses e meses. A justificação é simples: não consigo empenhar-me em nada. Daí a minha frustração. Estas férias deviam ser para eu escrever até mais não, ler todos os livros que pudesse, tratar de mim e conjeturar teorias sobre tudo o que não compreendo. Resumindo, sabia que ia ter uma férias muito exigentes a nível físico, mas quis que fossem também exigentes a nível mental. Infelizmente, há o tal problema: estou em hibernação emocional. E isso ...

O Fim - O Novo Começo

Dia 274: O Inverno aproxima-se, o Inverno que eu tanto espero que regenere o meu espírito, que o limpe e o purifique e que me torne em alguém que não é mais do que a versão mais simples e mais aperfeiçoada de mim. Será um Inverno produtivo, em que não tencionarei fazer mais do que melhorar-me, do que terminar os meus maiores projetos, limar os cantos mais rebuscados da minha mente, ser confortável, prática e feliz. Não tenho muitos impedimentos. Não tenho impedimentos de todo. Não é uma surpresa constatar que já não há nada que me proíba ou que me impeça de me transformar, de seguir com a minha vida, de me tornar num projeto interminável. Tinha (tenho) medo de mudar, porque achei que isso afastaria os sussurros do passado, que os apagaria de vez. E eu, por muito que dissesse o contrário, não queria, não estava preparada para que eles se fossem. Mas estou-o agora, sem querer, sem saber muito bem como. A verdade é que já me tinha mudado, involuntariamente. Tinha-me tornado nervosa,...

(Não) Mudanças

O profundo sentimento de agonia já não entra em mim, de algum modo. Não há qualquer sentimento que entre em mim, por sinal. A minha brilhante mente consegue apenas desesperar com o futuro, divertir-se com futilidades, sorrir com estupidezes. Consigo apenas cumprir as minhas obrigações e mal. A preguiça intelectual, emocional e física apoderou-se de mim. Não consigo escrever, ou estudar, ou simplesmente existir. Estou numa área cinzenta, num transe inoportuno. Não existe nada neste transe. É como se se tratasse de uma enorme divisão cinzenta, que nada mais tem que uma mera janela para a qual eu ouso olhar ocasionalmente. Essa janela arranca-me da preguiça, do transe, por breves momentos. Essa janela mostra momentos que criam uma tão pura nostalgia que eu sinto-me fora da minha redoma. Momentos simples, pequenos, pouco mais do que sussurros mal resolvidos. Momentos que não provocam só nostalgia, mas também um desespero inconsequente, um medo petrificante, perguntas tão ridículas quant...

''Tempo, tempo, que não volta atrás. Nem sempre há remendo para as asneiras que se faz.''

As sombras movem-se na meia escuridão. Sombras das minhas mãos a procurarem o meu rosto em mais uma noite sem dormir. Em mais uma noite atormentada por nada mais que eu própria. O tempo corre barbaramente. Sem eu dar conta passaram meses e meses, dias e dias, em que me foi sugada a vida. Já quis desesperadamente que o tempo parasse, já quis ainda mais desesperadamente que voltasse atrás. O tempo não me obedeceu. Mas obedece-me agora que lhe imploro que corra o mais sofregamente possível, como se se olhar para trás se vá tornar em cinzas. Eu suspiro, a manhã chega. Eu sorrio e mais uma semana passou. Não tenho memória de nada, porque não há nada para memorizar. A minha vida é pura velocidade, sofreguidão, escuridão. Tudo é um nevoeiro na minha mente, nada existe realmente. Já nem sequer o tédio me atormenta. Já passei o tédio, já passei o desespero, já passei as manifestações entre inspirações de quem quer existir, de quem quer pertencer. A pior parte já passou, digo eu, a sentir o ...

Ainda a contar...

Dia 237: Os murmúrios paralelos mantêm-se. Eu mal os ouço a sussurrar, a rir. A sala está quente, mais quente do que lá fora, imaginava eu. Fito a página em branco. Procuro na minha mente um qualquer rasgo de brilhantismo, de esperança. Nada. Tudo o que se ouve é silêncio. Dirijo o olhar para a janela que mostra a realidade deprimente de uma quinta-feira chuvosa e escura. Os enormes montes verdes eram uma constante animadora no longo e gelado Inverno que nos esperava. Sorri, ansiosa pelas noites sentada à frente da lareira a ler um livro, a árvore de natal a espreitar-me no canto do olho. É impossível sentir-se partida quando o calor nos invade suavemente as veias, a nossa casa cheira a comida e tudo é harmonia, amenidade, calma. O teu coração enche-se, remenda-se, torna-se uma nuvem pura e leve. Anseio pelo inverno gelado se ele significa um coração remendado. Sabia que para o meu coração já não havia remendo que valesse, mas alguns agrafos, talvez, resolviam a coisa. As noites ...

O ciclo sem fim

Ouvi algo estalar. Tudo aquilo parecia irreal, desde as luzes coloridas e presas, que tornavam a minha visão fracionada e lenta, à música ridícula e pulsante, que me obrigava a mexer-me e a participar, à mão que me prendia. De repente, o choque transformou-se em lucidez. As mãos dele começaram a pesar-me nas costas, o corpo dele começou a, finalmente e realmente, aparecer à minha frente. E, ao contrário do esperado, a minha vontade foi correr. Correr, mesmo que os meus pés, armados com uns tacões destruidores, se desfizessem. Correr, mesmo que acabasse por cair. Correr, mesmo que parecesse ridículo, patético, embaraçador. Pensei mesmo em fugir, refugiar-me em algum lugar onde chovesse profusamente, deitar-me no chão e fechar os olhos. Não pensar, não imaginar. Simplesmente desaparecer ali, deixar o meu espírito fugir daquele corpo magoado e abandonar-se. Porque tudo aquilo era demasiado real, demasiado familiar, demasiado passado. E assim, com a respiração dele no meu ombro, o corp...

Perdão não concedido

E se não ficou esclarecido: não, não te perdoo. Perdoei-te instantaneamente, como se nem importasse. Portanto, estou-te a dizer agora, passado todo este tempo: não te perdoo. Não te perdoo por teres destruído qualquer hipótese que eu tivesse em recomeçar. Não te perdoo por me teres mudado. Por me teres transformado num monte de espera, transe e dormência ambulante. Não te perdoo por me tornares velha e amarga. Não te perdoo por me tornares insegura, por teres lascado a minha autoconfiança, o meu ego. Por teres brincado com a minha paciência. Não te perdoo, após este tempo todo. Não te perdoo por ainda te ver todos os dias, em todas as minhas ações. Por me lembrar das tuas reações, das tuas palavras. Por ainda seres tão presente como se, de facto, estivesses sentado, neste momento, a meu lado. Não te perdoo por ter passado um ano e eu achar tão, mas tão, estranho as circunstâncias de estabilidade, de quase felicidade. Não te perdoo por andar completamente exausta, impossivelmente ent...

Não posso esperar mais .

Não sei bem porquê, nem como, mas estive à espera este tempo todo. Estive à espera de um milagre, de algo que curasse, de um remendo que pusesse tudo junto, tudo reconciliado. Esperei e esperei. Fartei-me de esperar por algo que nunca veio, ou que veio mas em pequenas doses egoístas. Em doses que não foram nem nunca serão o suficiente. Desperdicei tanto tempo da minha vida à espera de sinais, de palavras, qualquer coisa. Aliás, penso que estive este tempo todo simplesmente à espera de uma sincera ''desculpa''. Se a tivesse tido, penso que teria esquecido tudo isto há muito mais tempo. E agora acabou. Estou farta, farta de desperdiçar tempo da minha juventude amargurada. Não posso esperar nem mais um segundo. Não posso passar nem mais um segundo apaixonada por um fantasma. Sim, porque ele não é mais que um fantasma. É tão real como os meus sonhos, está tão visível como os sussurros das folhas das árvores, está tão presente quanto todos os que partiram para nunca mais v...

Medos

Meus queridos leitores, Nos últimos tempos, tenho andado bloqueada em termos literários. Assim sendo tenho deixado a minha mente descansar, não me forçando a escrever textos que de certeza sairiam inconsequentes e forçados. Hoje, no entanto, decidi que era altura de o fazer e que, não estando inspirada, deveria fazer algo que nunca faço: dirigir-me a vocês diretamente. Além disso irei hoje, também, escrever mais do que um texto para compensar todos aqueles dias em que não fiz nenhum. Neste texto em particular vim abordar um assunto que me tem incomodado especialmente nos últimos dias. Os medos. Não me refiro a medos de demónios ou a sobrenaturais ou coisa do género, nem a fobias. Refiro-me a medos no que toca ao futuro. Fui amaldiçoada com esta incapacidade de viver no presente. Só me é possível viver ou no passado ou no futuro. Nos últimos tempos o passado já não me incomoda (razão principal do meu bloqueio de escritor), portanto tenho-me atormentado com os meus planos para...

Perguntas

Os meus olhos cegaram-se de novo. As vozes tornaram-se apenas ecos no fundo da minha mente, as cores desapareceram. Tudo foi transformado nos escuros recônditos da minha mente, os quais eu já tinha visitado demasiadas vezes naquele dia. E aí, isolada pelas paredes de cimento dos meus pensamentos, ousei libertar as minhas frustrações, as minhas nostalgias, as minhas angústias. As minhas perguntas. Lembrei-me do dia anterior, a imagem dele a atravessar o campo de futebol, a fina chuva a criar uma áurea idílica à volta dele. Lembrei-me dessa manhã, em que os olhos dele se cravaram em mim, tão iguais... Meu Deus, tão iguais. O meu coração começou a bater descompassadamente. É tudo demasiado igual, um dèja vu, uma espiral infinita, um pesadelo! Não desaparece nunca, não se esmorece, não me deixa respirar! Não estou livre em lado nenhum, nem na minha própria mente! Sinto a infinita vontade de perguntar tudo, de pôr em questões tudo o que me tem vindo a atormentar, a moer, a torturar! ...

Recordação ambulante

O ambiente passou de escuro e frio para festivo e cheio. As vozes animadas do espaço transformavam tudo em luz e calor. O cheiro a bolos e café impregnava o ar e criava uma aura de refúgio do frio que se enfrentaria lá fora. Era cedo para esse tipo de constatações. Em fins de setembro o tempo não estava frio, apenas cinzento e frustrante. Mas dentro daquele espaço quente e isolado era difícil não imaginar nevões a cobrir o chão lá fora. Envolvida pelo cheiro permanente a confeções doces, avancei a passos largos no acolhedor espaço. Os olhos dele foram os primeiros a encontrar-me assim que transpus a porta improvisada. Os meus também cedo encontraram os dele e, como sempre, não se desviaram. Só desviei o olhar quando me sentei de costas voltadas para ele. Não me atrevi a certificar-me se ele ainda estava a olhar, sentindo já o meu coração a esmurrar as minhas costelas. Não sei o nome dele. Já o devo ter ouvido algures, mas provavelmente não quis saber, até porque não faria diferença...

Tardes de chuva

Os meus olhos cruzaram-se com os dele. No meio daquela gente toda, senti algo quente a borbulhar-me na pele. Quis sorrir, mas sabia que não era boa ideia. Apressei-me portanto a desviar o olhar e a ser empurrada pela multidão. No meio de todas aquelas vozes, de todos aqueles passos mecânicos na mesma direção, debaixo da chuva miudinha que preenchia o ar de um cinzento sufocante, eu permiti-me pensar naquilo que tinha tentado abafar o dia todo. Perguntei-me o que raio é que nos tinha acontecido. Como é que, quase de repente, tudo se extinguiu, se apagou, se foi. Como é que, no que parece tão pouco tempo, eu passei de o adorar, para ele me ser como o nevoeiro fino que me atravessava nesse momento. Como é que eu, que me perdi naqueles olhos tão castanhos, que deixei tanto, mas tanto tempo da minha vida neles, simplesmente me esqueci. Como é que eu passei de ter tantas saudades agoniadas para só me lembrar dele quando os meus olhos se cruzam involuntariamente com os dele. Como é que eu p...

Se eu tivesse sabido...

Estive a ver fotografias. Tanto minhas como alheias, de há uns anos, de há uns meses, de há umas semanas. Consegui localizar as situações em que estava metida em todas elas, como começaram, como acabaram. Enchi-me de uma nostalgia profusa, que agiu como pequenas cordas que sufocavam ligeiramente o meu peito. Enchi-me de saudades de tudo o que eu dizia ou fazia, de como a vida era, de como eu me sentia nessas alturas. Foi-me tão interessante quanto doloroso ver a minha evolução, ver o quão depressa o tempo passou e quanto mudou em meros meses. Não só fisicamente, apesar de, de facto, em poucos meses, eu parecer outra pessoa, mas essencialmente em termos de personalidade, em termos de... Farpas. Lembrei-me desta palavra no momento em que me deparei com uma fotografia, A fotografia. Já não olhava para ela há tantos meses, já nem me lembrava da existência dela. Mas naqueles minutos em que a fitei, senti exatamente isso: farpas. Farpas geladas que se cravaram no meu coração. E eu, que há ...

Será?...

Não me consegui impedir. Não sou propriamente um modelo de autocontrolo, mas em geral consigo pelo menos controlar os meus pensamentos. Aparentemente perdi essa capacidade. A minha mente mergulhou em redundâncias, em repetições de tantos momentos passados, em ilusões sobre momentos do futuro. Até me sinto estranha quando isto acontece porque já passou demasiado tempo, já lasquei essa parte de mim aos bocados. Fiz então um esforço por estar atenta, por me concentrar, convencendo-me que era importante, que eu ia precisar de tudo o que estava a ser dito. Mas minutos, talvez apenas segundos, depois, já a minha mente estava bem longe daquele restrito lugar, longe daquelas opressivas paredes. Tanto em tempo como em lugar. Fico presa em tempos muito mais interessantes, tempos em que, de facto, eu tinha algo por que ansiar. As minhas memórias e ilusões chegam a constranger-me de tão desaquadas. São desadequadas porque importam algo que eu já não creio ter no meu coração. Rancor, tristeza. J...

De setembro de 2012 a setembro de 2013...

Estava a ler tudo o que escrevi desde aquela desastrosa noite há tantas noites atrás. Li cada pensamento magoado e destroçado, cada palavra carregada de saudade e desprezo, de desassossego e insónia. Li o suficiente sobre essa rapariguinha mudada, ingénua, completamente inocente e sem noção. Sobre as esperanças dela, as dores, as torturas. Essa rapariguinha tinha desaparecido. No lugar dela ficava uma mulher, ácida e independente, feliz e sóbria. Não significa que aquilo que me aterrorizou naquela noite desapareceu, está ainda bem presente, bem expectante. Mas já não daquela maneira tortuosa, que me trazia o pânico ao peito, que me impossibilitava a respiração, que me inundava em mágoa e mágoa, tão antiga e tão inútil. Ainda passo o dia a encher-me de memórias. Qualquer coisa me traz uma nova memória, seja o dia, seja o mês, seja a hora, seja o lugar, seja uma qualquer palavra. Ainda o espero encontrar em todos os cantos, a cada segundo, a todos os segundos. Ainda o procuro, o que é ...

''When you feel a feeling that you never felt before''

O cheiro é inebriante. Sei que se prolonga na minha camisola, no meu cabelo, nas minhas mãos. Que mais tarde ou o farei desaparecer ou o aproveitarei, inalando-o outra vez, sentindo tudo de novo. A minha pele está toda arrepiada, lenta, suave. Os meus músculos ficam moles, como se não aguentassem o peso do meu corpo, como se precisassem de apoio, de suporte. Felizmente eu tenho apoio. Estou subitamente cega. Não porque literalmente deixe de ver, mas deixo de figurativamente ver. Os meus olhos estão baços e veem muito além daquelas paredes ruídas, muito além daquelas cores de verão e outono, misturadas numa orgia maravilhosa. Os meus ouvidos ouvem muito além daqueles sons da natureza, tão simples, tão fáceis. A minha respiração fica difícil, lenta. Torno-me, de repente, impossível de suportar sozinha. Não me consigo sequer mexer, as minhas reações usuais, extremamente reativas, desaparecem. E eu já não sou eu, o mundo já não é o mundo. Até que por fim, aquela tortura tão deliciosa, ...

Pensamentos Proibidos

O meu estômago revolve-se outra vez quando na minha mente sorri outra imagem, outra sensação, outra memória. Fico chocada com o meu desplante, com a minha descontração, como se de nada se tratasse. Porque para mim, de nada se trata. Não é que não queira partilhar-me com outra pessoa, não é que não queira sorrir e olhar e tocar e todos esses hábitos. Mas não consigo, não outra vez. Não é porque tenha sido uma experiência traumática, é porque a prisão que tudo isso é tira-me toda a luz interior. Quero as minhas aventuras outra vez. Simples, fáceis, rápidas, e no entanto cheias de romance e felicidade mesmo que seja por pouco tempo. Quero uma história de amor sem amor outra vez. Não quero ter a vida organizada, ter a sensação de que tudo está onde pertence. Quero confusão, não drama. Quero um escape rápido e eficaz. Resumindo, quero simplicidade. Porque não quero, não consigo, apaixonar-me outra vez. Pelo menos nos próximos tempos, portanto prefiro divertir-me com pequenas e simples h...

O Rapaz

Os olhos verdes dele comem-me a alma. Não consigo desviar os meus, mal consigo respirar. Vejo o sorriso dele e já sei no que ele está a pensar, já sei a maneira embevecida com que devo estar a olhar para ele. Faço portanto um dos maiores esforços que já fiz e desvio o rosto, ignoro o ar de triunfo dele, afasto-me. Ele acaba por me puxar para ele, por me perguntar porque fico nervosa à beira dele, por encostar a testa à minha e por sorrir com aquele sorriso de absoluta felicidade, como se tudo estivesse certo no mundo. Eu resmungo algumas palavras carregadas de ódio, que ele desarma com uma facilidade incrível. Sinto-me irritada e digo algumas palavras que sei que o magoam. Mas só o magoam momentaneamente. Segundos depois, lá está ele a fazer-me aquele sorriso e a prender-me nos braços dele. Ele diz que me vai levar à exaustão. Que há de ser o primeiro a fazer-me frente.Que havemos de aprender muito um com o outro, que o futuro só nos reserva coisas boas. O meu estômago revolve-se, ...

Indecisões

''Porque não?'' perguntam os meus olhos deliciados. ''Porque sim?'' pergunta o meu cérebro, já cansado e irónico, já farto da facilidade com que a vontade de ceder se instalava em mim. ''Mas porque não? Porque não ceder outra vez, divertir-me, ser feliz nem que seja só por um tempo?'', responde o meu corpo, concordando com os meus olhos, a vibrar e a sorrir. ''Todos nós sabemos como isso geralmente acaba...'' suspirou o meu cérebro, frustrado e irritado. ''Ninguém se iria magoar. Seria simples e fácil.'' dizem os meus olhos, não compreendendo a recusa do meu cérebro, a vontade deles a ceder ao discernimento. ''Nada é simples'' diz mais uma vez o meu cérebro ''Ambos sabemos que mesmo que seja simples para ti, o mesmo não acontece para a outra parte.'' Mexo-me desconfortável na cadeira. Era verdade. Nunca nada seria simples. ''Então render-nos-íamos a algo comple...

The Lady

Dia 162: A mulher no espelho sorri-me, radiante. Os cabelos de um loiro negro brilham, os olhos pretos resplandecem, a tez morena contrasta com os lábios perfeitamente delineados, pintados de um vermelho contundente, que se abriam num sorriso que mostrava os dentes brancos. O prazer que retirei de cada segundo daquela auto-observação foi um tanto ou quanto doentio. Estava de volta. Não me lembrava da última vez em que a visão de mim própria me tinha preenchido por completo os sentidos. O meu amor-próprio pelos vistos não tinha qualquer mácula, eu estava impecável e pronta. Foi, no entanto, um choque ao perceber que, pela primeira vez desde sempre, eu parecia uma mulher. Não uma menina, não uma miúda, não uma rapariga. Uma mulher. Acredito que já tenha passado várias vezes por uma, mas nunca me tinha realmente sentido como uma. Achei que só esse pormenor, só essa visão, ia ser o suficiente para a noite que se sucederia ser um sucesso. Devo-me ter esquecido que essa noite era para eu se...

Love stories

Para uma pessoa que se considera independente de romance e incólume de amor já atravessei imensas histórias, algumas ridículas, outras divertidas, outras marcantes. Claro que quando se está envolvido na história não se tem a noção do porquê de ser tudo isso. Apenas quando se sai, ileso ou não, é que ao olhar para trás se sorri ou se cora. Acho que o tempo nos traz sabedoria. Daí que considere a maior parte das minhas ''histórias de amor'' desnecessárias. Desnecessárias porque, talvez, não eram histórias de amor. Porque não eram mútuas, porque sou demasiado nova para tal coisa, porque algumas foram apenas fogo de vista, porque foram só ilusões na minha cabeça. Ou, talvez, que se dane tudo isso. Não deixam de ser histórias porque sou muito nova. Aliás, faz mais sentido que assim seja, nesta idade em que as nossas hormonas andam aos saltos e os nossos corações correm. Não considero a história que vos ando a contar há meses uma história de amor. Considero, sim, uma histór...

Acessos de raiva - I

Não me julgo capaz de odiar. De odiar vozes, sons, atitudes, frases, paisagens, talvez. Mas odiar pessoas? Não creio. Não creio que o meu peito tenha as dimensões necessárias para ódio. Ou para amor, por sinal. Portanto, não penso que tenha, realmente, odiado alguém. Mas desprezar? Sem dúvida. Desdenhar? Sem dúvida. Já não sentia o calor abrasador da raiva há muito tempo. Queima-me as entranhas, envenena-me as palavras. Fúria é-me regular, rotineira, mas a fúria é fria, rápida, como um fogo gelado. A raiva consome-me devagar e lentamente, tortura-me com o calor no estômago que sobe pelo esófago. E acaba por definhar ou em lágrimas ou em desprezo frio e absoluto. O bom de tudo isto é que não existe outra emoção em mim para além de absoluta e controlada raiva. Não existe nostalgia ou saudade ou seja o que for. Esta raiva, estridente e infinita ocupa toda a minha mente. Faz-me encher-me de nojo e indiferença por esta pessoa que eu nunca pensei que me viesse a inspirar tais sensaçõ...

''Sweet'' 16

Estou velha. Absolutamente velha. Cansada de tudo e todos. Preparada para um ano de sofrimento, preparada para o resto de uma existência de esforço contínuo. Assumi toda e qualquer obrigação. Sujeitei-me a todas, mesmo sem me aperceber. De repente sujeitei-me a ser uma boa filha, uma boa atleta, uma boa amiga, uma boa aluna. Assim, como se nada fosse, como se não custasse nada. Ser nova não era suposto significar divertir-me? Ser indiferente, fazer asneiras? Então nunca o fui. Nunca fui despreocupada ou descontraída, ou indiferente. Nasci adulta, aparentemente. Não sei quando aceitei ser velha mesmo sendo nova, mas aparentemente aconteceu, aparentemente tomei essa decisão. Aparentemente, em algum ponto na minha vida, decidi que ela seria uma infinita lista de tarefas e obrigações. Sussurro para mim própria que é só mais um ano, um ano de exaustão e infinito cansaço, um ano em que não tenho tempo para mim ou para aliás mais nada que não sejam essas tais de obrigações. Sussurro par...

Reino das Trevas

Quinta feira, 8 de agosto de 2013: Escrevo-vos, nesta tarde de quinta feira, a tão poucos dias do meu Dia, neste parapeito  entre as enormes montanhas que ameaçam o céu valenciano e as praias paradisíacas que o iluminam.  A claridade que recuperei até agora, trouxe o meu anterior caráter ácido e racional. A racionalidade assenta-me, apesar de me tornar amarga e triste. A racionalidade enche-me os olhos de ironia e cansaço, relembrando-me que há um mês atrás eu bem precisava de um pouco dela e ela não existia e agora cá está, reclamando de novo o seu lugar. Infelizmente, já estou tão fundamentada em irracionalidade que será impossível eu tomar as decisões racionais nos próximos tempos. Há um mês atrás, eu era uma miúda de coração partido, mergulhada na estupidez e na ridicularidade. Surpreendi-me quando percebi que isso se havia alterado, e que o facto de isso se alterar me permitira retornar ao meu velho feitio envenenado. Surpreendeu-me que a perda se tivesse dissipa...

A Descoberta

Descobri, hoje, algures entre as doces alvoradas e os amargos fins de tarde, que estava pronta. Pronta para um nova aventura, pronta para me receber, pronta para a conclusão. Descobri-o enquanto suspirava pela falta de pensamentos na minha mente, enquanto me apercebia que aqueles que realmente tinha eram finos e fugidios. Que a enorme cortina de ferro que pendia sobre mim começava a subir e a desfazer-se. Percebi-o quando a conclusão de que talvez nunca mais o veria me trouxe absoluta e completa resignação. Descobri que as tardes eram agora mais doces, que as letras encravadas nos livros eram de uma humildade perfeita, que o meu coração estava leve e vazio. Talvez seja efeito do relaxamento a que estou sujeita, do azul profundo do mar, do som infinito das praias, das vistas intermináveis das montanhas. Talvez seja uma bonita ilusão, que desaparecerá assim que eu puser pé em solo português. Então, aproveitá-la-ei. É-me, de facto, impossível pensar em seja o que for para além da est...

Espanha

Quarta-feira, 6 de agosto de 2013: Nunca pensei que a distância da minha terra perdida no Além Douro me fosse trazer claridade. Julguei piamente que a paz que tanto preciso não estava escondida entre o calor abrasador valenciano, entre as planícies profundamente flamencas, entre a prosperidade dos campos e dos sorrisos catalões. Porém, a minha alma, tenebrosamente portuguesa, precisava de esvaziar. O meu peito estava cheio, não sei muito bem de quê ou porquê.  E aqui, nesta terra abrasadora e coberta de iodo, é o sítio ideal para todo o meu ser se esconder e se transformar. É o sítio ideal para eu largar toda a ansiedade, todas as preocupações. Para deixar, neste canto tão adverso à minha morada, todas as aflições. É o local ideal para a regeneração do meu espírito, espírito esse que já começava a recuperar-se. Descobri isso enquanto suspirava de futuras saudades pela minha terrinha à beira mar. Enquanto, eternamente saudosa, percebi que a escuridão me havia abandonado....

Contos de Fadas

Era uma vez um príncipe. Um príncipe que eu tive o prazer de conhecer há não assim tanto tempo, em circunstâncias não assim tão diferentes. Como todos os príncipes de todas as histórias que se prezem, este seguia-se por um código de honra e cavalheirismo, de dedicação e compromisso. Esse príncipe estava apaixonado, ou pelo menos assim o pensava. Como em todas as histórias que se prezem havia um conflito, que transformava o amor que supostamente era nutrido pelas duas partes em algo proibido e complicado, neste caso eram os intermináveis quilómetros que os separavam. Mas não era esse o único problema. O príncipe não estava apaixonado por uma princesa, apesar de o crer. As princesas dos contos de fadas são subtis, tímidas, calmas, graciosas e bondosas. Os olhos delas concedem a paz às almas atordoadas, as suas ações acalmam as revoluções da natureza. Mas esta rapariga não era assim. Assemelhava-se mais a uma vilã que a uma princesa, na realidade. Os olhos dela, negros e desiludidos, a...