Independência - II

Margarida riu-se largamente com a voz descontraída de Rafaela. Amigas desde o secundário, conhecidas desde a preparatória, Margarida encontrava em Rafaela uma calma de espírito contagiosa que achava ser inestimável.
- E então miúda, como estão os maravilhosos campos do Mondego?
- Estou em Trás-os-Montes, Rafa, em lado nenhum se vê o Mondego. - Riu-se.
- Oh, Geografia, Geografia... Olha queres saber o que se tem passado por aqui?
- Com certeza.
- Sabes aquele jeitoso que vivia na rua atrás da nossa na faculdade?
- O Marco, claro. Tivemos tanta pena quando ele acabou o último ano e voltou para a ''Coimbra do Mondego''.
- Sim, esse mesmo. Ontem tive o prazer de me cruzar com ele. Ele lembrava-se de mim!
- Não me acredito! E que raio está esse Adónis a fazer na cidade invicta?
- Arranjou um emprego lá, na firma central!
- Tu e os advogados, Rafa...
- Que queres que te diga?... Têm qualquer coisa extremamente irresistível...
- As tretas? - Sorria desenfreadamente.
- Oh. E tu, já encontraste algum camponês selvagem que te rasgasse a roupa no meio das vacas e dos bois?
- Não, lamento. Quando o fizer prometo que te aviso.
- Acho bem. E estás bem?
Margarida suspirou. O sol punha-se atrás da sua janela. De olhar colado no horizonte, confessou:
- Fisicamente, sim. Emocionalmente, nem por isso. Tenho saudades dele, Rafa. Nem sei o que fazer.
Mantiveram-se ambas em silêncio por uns momentos. Depois Rafaela disse, num tom de voz compassivo:
- Tenta distrair-te. Ou não. Faz o que precisares para ultrapassar.
- Não acho que alguma vez vá conseguir.
Foi a vez de Rafaela suspirar.
- Claro que vais. És nova, bonita, inteligente e divertida. Qualquer homem teria sorte em ter-te. Não é um único que vai parar a tua vida. Agora faz o favor de arranjar um camponês jeitoso e depois falamos.
Margarida sorriu.
- Sim, senhora. Porta-te bem, Rafa.
- E tu porta-te mal mas sempre com classe.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

O Animal

O ciclo sem fim

A ironia da indiferença