Flash back

''Os meus olhos estão cegos. Fitam as paredes caiadas, enfurecidos, desiludidos. Como se eu já não soubesse.
Os meus lábios distorciam-se numa expressão de nojo, de desprezo. Detestei-me por uns segundos. Se eu sabia, se eu já sabia, porque fingi que não?
Porque me deixei enganar como se fosse nada, como se fosse lixo?
A resposta para todas estas perguntas delineava-se no ecrã do meu computador. Ecrã que eu ignorava deliberadamente. Ele estava bem. Ótimo, até. E eu detestava-o por isso.
Detestei-o tantas vezes ao longo dos últimos dez meses. Todas as vezes tinham uma razão particular. A primeira foi por ele ser tão diferente que me fascinava de uma maneira que eu não achei ser possível. Depois por ele dizer aquilo que dizia, por mexer comigo. Depois por ter dito ''aquela palavra''. Como se fosse assim tão fácil. Como se fosse óbvia, até ridiculamente óbvia. Depois por me fazer sentir da maneira que eu me sentia.
E, no fim, por ser o fim.
Já não estarei farta de o detestar? De esperar? Já não me tinha passado esta estupidez?
E ele trouxe-a de volta. Porque queria estar de volta. Porque parecia que ele queria estar de volta. E eu comecei a considerar que isso não era uma má opção. Porque precisava, preciso, de alguém com força suficiente para carregar o meu coração partido. Para me carregar. E ele era essa pessoa, sempre o foi. Nasceu para ser perfeito a tudo, o maldito rapaz.
Precisava de momentos que me fizessem esquecer o passado, que me fizessem esquecer os problemas. E ele dava-mos. Dava-me aqueles maravilhosos e simples momentos, de tirar a respiração. Só por ser ele próprio.
E eu preciso disso. Preciso de me esquecer do meu coração partido.
No momento em que eu reconsiderava deixá-lo voltar, ele saiu. O mais rápido que pôde. Outra vez.
E assim, a sentir-me humilhada, usada e ingénua (já não me sentia ingénua há eternidades, meu Deus), fechei o meu coração, ou a imitação de coração que tenho. Pela milionésima vez.
E jurei, jurei que desta vez ia tratar bem dele.
Mas eu sou uma pessoa demasiado medíocre para fazer promessas...
Fechei os olhos. E os laivos de fúria cessaram. Os rasgos de agoniada desilusão ficaram dentro de mim.
Quando voltei a abrir os olhos, eles estavam vazios de emoção. Como sempre os quis...''

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