Viver a vida

Nunca fui uma pessoa extremamente sociável. Sempre tive um medo tremendo de pessoas novas, de situações novas. Sempre preferi o que era familiar, natural, simples. Talvez seja essa a razão pela qual vivo mais no passado do que no presente. Porque não gosto de mudanças, porque penso sempre que as coisas eram melhores antes e piores agora. Mas talvez não o sejam.
Nunca fui de palrar. De falar muito. Sempre detestei pessoas que não se calavam, monopolizando as conversas, impedindo as outras de falar. Sempre as detestei porque apesar da torrente de palavras que lhes jorrava pela boca, não diziam nada de jeito. Ao contrário de mim. Se eu não tivesse talvez um pouco de vergonha de toda a minha eloquência, talvez fosse extremamente sociável, talvez tivesse um milhão de amigos. Perdoem-me as minhas ilusões. Os jovens de hoje em dia não querem eloquência e sem dúvida que não querem todas as minhas lições de vida, todos os meus factos e conhecimentos. Sou demasiado velha, demasiado inteligente para esta geração. Que miúda é que quer falar sobre política, ou filosofia, ou polémicas, ou história ou seja o que for com significado? Esta geração é oca, materialista. Eu própria sou extremamente materialista. Infelizmente não tenho ponta de oca. Não sei ser baseada em roupa e acessórios e paixonetas. Não quer dizer que não goste dessas coisas, apenas não sei ser só isso. Se o fosse, acreditem, teria milhares de amigos.
Outra razão pela qual nunca falei muito é pelo facto de que, oralmente, não faço ideia como me expressar. A minha vergonhosa eloquência apenas existe em assuntos que não interessam a ninguém. Em todas as questões de adolescentes do século XXI, tudo o que consigo fazer é sorrir e acenar. Bem como em todas as questões emocionais, mas isso é um travão que eu sempre tive.
Sempre achei que havia qualquer coisa de errado comigo. Porquê que toda a gente conseguia misturar-se, socializar, integrar-se e eu não? Percebi mais tarde que se chamava personalidade. Não sou uma pessoa fácil. Sou um gosto adquirido e isso transparece logo nas primeiras impressões. Aprendi a gostar disso em mim.
A que vem tudo isto a propósito? Chegamos a uma idade em que tentamos desesperadamente aproveitar cada segundo da nossa vida. E a isso inclui-se ir a festas, beber, fumar, falar sem cessar sobre nada. Adoraria adorar tudo isso. Adoraria adorar a música hipnotizante, os movimentos serpenteantes das pessoas, as cores rodopiantes das bebidas, o cheiro infinito do tabaco, as palavras inventadas dos jovens. Adoraria que para mim ''viver a vida'' fosse isso. Mas não é. Viver a vida para mim pode ser simplesmente estar num café à beira mar, à noite, a falar e a rir. Pode ser simplesmente vestir-me bem para uma ocasião qualquer. Pode ser simplesmente descontrair na praia, pode ser simplesmente dançar ao som das colunas no meu quarto ou ouvir jazz enquanto leio um livro. Pode ser simplesmente tomar banho depois de correr, ou estar sozinha. Para mim viver a vida é tudo o que é saudável, tudo o que me ajude a recolher os meus pensamentos, tudo o que é zen e simples. E, muitas vezes, tudo o que faço sozinha.
Portanto uma vida social ativa e diversificada não vos faz feliz, meus leitores. A não ser que estejam realmente desesperados por atenção ou aprovação alheia. E não vos serve de nada fazerem coisas de que mais tarde se irão arrepender.

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