Little Girl

Dirigi-me ao espelho.
Ao contrário do que esperava, não vi o meu reflexo e sim o de uma menina pequena, nova, que olhava para mim intrigada.
Era muito parecida comigo, reparei. Os mesmos grandes olhos castanhos, dotados de uma inocência inconsequente que já não existe em mim. O mesmo cabelo castanho, a mesma tez clara.
Sorri-lhe ternamente. Ela inclinou o rosto para a direita e devolveu-me o sorriso. Devolveu-me o meu sorriso de marca, como a minha mãe tanto se diverte a recordar.
Observei-a atentamente. Aquele sorriso carregava muita amargura para alguém que cingia a sua vida a princesas Disney. Talvez fosse o reflexo do meu sorriso. Teria assim tanta amargura?
Sentei-me na cadeira mais próxima para estar mais cómoda. Ela fez o mesmo. Contei-lhe tudo o que se passara, tudo o que havia feito. Vi o rosto dela empalidecer, distorcer-se, mas os olhos dela nunca deixaram os meus. Vi a inocência desaparecer.
Senti os meus olhos encherem-se de lágrimas e perguntei-lhe de voz embargada se ela estava desiludida, se ela detestava aquilo em que se havia tornado. No entanto a água salgada só escorreu nas faces dela. O meu rosto manteve-se seco e firme.
Ela sorriu-me por entre soluços. Não disse nada, mas encostou a mãozinha dela ao espelho. Coloquei a minha em frente à dela.
Sorri-lhe. O meu sorriso de marca no rosto dela desapareceu. E após eu pestanejar já era o meu reflexo que via.
Suspirei.

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