Recordação ambulante
O ambiente passou de escuro e frio para festivo e cheio. As vozes animadas do espaço transformavam tudo em luz e calor. O cheiro a bolos e café impregnava o ar e criava uma aura de refúgio do frio que se enfrentaria lá fora. Era cedo para esse tipo de constatações. Em fins de setembro o tempo não estava frio, apenas cinzento e frustrante. Mas dentro daquele espaço quente e isolado era difícil não imaginar nevões a cobrir o chão lá fora. Envolvida pelo cheiro permanente a confeções doces, avancei a passos largos no acolhedor espaço. Os olhos dele foram os primeiros a encontrar-me assim que transpus a porta improvisada. Os meus também cedo encontraram os dele e, como sempre, não se desviaram. Só desviei o olhar quando me sentei de costas voltadas para ele. Não me atrevi a certificar-me se ele ainda estava a olhar, sentindo já o meu coração a esmurrar as minhas costelas. Não sei o nome dele. Já o devo ter ouvido algures, mas provavelmente não quis saber, até porque não faria diferença...