Considerações de finais de ano

Não acredito que por as doze badaladas tocarem a minha vida vá mudar de todo.
Mas acredito que assim que as doze badaladas tocarem chegará o ano que mudará a minha vida.
2015 será um ano de decisões, um ano de mudanças extremas. E a minha forte personalidade não gosta nem das mudanças mais pequenas, portanto imagine-se.
Sinto que o fim de dezembro e as férias me trouxeram algo que eu não tinha há muito tempo: paz, compreensão, tolerância. Sinto-me um lago de água calma.
Sinto que compreendo finalmente muitas coisas que antes não compreendia. Sinto que me permito a muitas coisas a que antes não me permitia.
Sinto que sei o que é a humildade, ou pelo menos algo do género. Sinto que sei quem finalmente sou. Sei, finalmente, do que gosto.
Compreendi que fui feita para uma vida calma mas entusiasmante, para rotinas doces e para romantismos silenciosos. Compreendi que, a cada momento, me fecho mais na minha própria mente, impedindo os outros de lá entrarem. Compreendi que, a cada momento, acho os sons mais inúteis. Acho que o mundo devia ter um botão ''mute''.
Compreendi que sou um porto seguro, sou confiável. Sou o que sou. Isto costumava incomodar-me, porque todos queremos ser vistos como algo inconstantes, algo misteriosos. Mas não sou nada disso. A única coisa inconstante em mim é o meu humor.
Compreendi que não posso fazer as pessoas esperar. Não posso controlar tudo. Por muito que tente controlar a vida dos outros, as ações dos outros, o trabalho dos outros, não o posso fazer. Parece que vou ter de aprender a confiar que as pessoas fazem o que fazem e, o que quer que façam, pode não ser pior do que o que eu faço.
Tenho de parar de pensar o pior das pessoas. Em geral, resigno-me que os seres humanos são animais e, portanto, agem como tal. Talvez esteja na altura de não ser tão pessimista.
Compreendi que não posso parar a vida de uma pessoa porque não estou pronta para avançar na minha. Se eu quero ficar parada no tempo, é comigo, mas não o posso obrigar a ficar parado a meu lado, à espera.
Compreendi que tenho uma capacidade de perdão enorme, mas que há uma e uma única situação que nunca fui capaz de perdoar, passados todos estes anos. E, por ela, culpo até inocentes. Pessoas que são meros figurantes nesta história.
Compreendi, finalmente, que nunca vou esquecer. Mesmo quando já não me lembro, nunca esquecerei. Uma parte de mim ficou guardada nesse tempo e as pessoas não se conseguem esquecer de quem eram em certas alturas da sua vida, por muito que o queiram. Não vou esquecer. E, curiosamente, há coisas de que não me consigo livrar. Como dos olhos inanimados que me fitam neste preciso momento, como do vestido dourado escondido no fundo do meu armário, como da fotografia no meu telemóvel, como das músicas que eu não apago mesmo já não as ouvindo há anos.
De tanto em tanto tempo o meu inconsciente faz questão de me relembrar. Mas não faz mal. Não faz mal que eu não tenha esquecido, percebo isso agora. O tempo encarregar-se-á de me levar para uma fase da minha vida em que eu não terei tempo de me lembrar. Portanto, não faz mal. Eu compreendo.
Compreendi que as minhas relações estão cheias de rancores. Daí que eu deva desprender-me delas, algum dia, já não tão longe. Quando algo já foi usado demasiadas vezes devia ser eliminado. Se bem que essa regra também se aplica a mim, de alguma forma.
Nada faz mal. Tudo é compreensível.
A minha vida vai mudar a pontos inimagináveis e eu sinto que nem sequer começo a imaginar o quanto.
Mas não faz mal.
Finalmente começo a aceitar o olhar que ele me dirige. Aquele olhar verde que me faz parecer o único ser existente neste planeta. Já o procuro, já não tenho medo. Mas não deixo de não me esquecer, não deixo de me lembrar de quem sou. E quem eu sou pode adorá-lo, mas também teme a promessa que ele está pronto para fazer. A promessa de permanência. Não estou pronta para a permanência, principalmente num ano em que tudo o que foi permanente se vai lavar de mim.
Que 2015 venha com calma e que passe lentamente. Eu preciso de me agarrar às minhas últimas réstias de infância, preciso de passar por inúmeros rituais de despedida, antes de estar pronta para o próximo passo.
Preciso de estar pronta para me esquecer. E preciso de tempo para o fazer.

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