Divagações perdidas

E, como já era de esperar, assim que pus os pés no solo seguro do meu lar, os meus sonhos e as minhas ilusões evaporaram-se.
Retornei ao meu peito granítico, ao meu olhar perdido, às minhas divagações pessimistas. E tudo o que até aí parecia um conto de fadas, parecia destinado por ser tão simples, tão conveniente (e por eu precisar de tudo isso tão desesperadamente que parecia que me faltava o ar), pareceu-me inferior a mim, pareceu-me apressado, exagerado, demasiado sensível para o meu gosto.
A realidade caiu-me, de repente, em cima. A realidade do stress, a realidade que me ocupa cada milímetro do meu cérebro e que me impede de pensar em seja o que for que não sejam aqueles dois objetivos da minha vida, aquelas duas grandes potências da minha vida, que me ocupam o tempo e a paciência, apesar de eu já não amar nenhuma. E essa realidade lembrou-me que eu não estou preparada, que eu não consigo amolecer de novo. Pensei que sim, pensei que conseguia voltar a descongelar, que conseguia mudar para aquilo que fui (E MAL) durante breves meses. Pensei que se me apaixonasse que tudo voltaria a rosas e perfume como fui por um tempo tão breve...
Mas eu não me consigo apaixonar. Porque pensei que conseguia? Porque pensei que conseguia voltar a ser tão jovem como era, jovem o suficiente para ter aquela sensação fresca e avassaladora no peito? Não consigo, sou demasiado velha para paixões. Até as posso ter, mas são demasiado breves, fugazes, insignificantes. Começam num olhar chamuscante e acabam no primeiro sorriso. Começam com uma qualquer troca de olhares cheia e terminam no momento em que a outra parte dá um passo em frente. Eu já não tinha capacidade para paixões ou para amor.
E tinha-me resignado com isso. Que interessava se nunca mais ia sentir aquilo? Não seria melhor se sentisse algo diferente, mais maduro? Mas mais maduro significa vazio, significa insuficiente. Queria aquelas paixões perdidas e hormonais de há tanto tempo. Portanto, procurei-as. Explorei onde podia e encontrei muita paixão e muito amor. Só que esses sentimentos não estavam no meu peito. E por muito que eu adorasse o portador desses sentimentos, eles não eram suficientes. Não para mim, que procurava o eterno, o absoluto. Não para mim, que tinha uma ideia bem clara do que me daria aquilo que eu queria e não era ele.
Mas que ia eu fazer? Voltar à vida boémia de olhares fugazes e adeus igualmente tão fugazes? Não queria, queria desesperadamente acordar essa parte adormecida de mim, a parte que berrava, que implorava, por amor ou por paixão, ou por seja o que for que não fosse indignação, enjoo, ansiedade! Estava tão farta de ser um bloco de gelo! Queria calor, queria que nascesse um verão dentro de mim! Pelo menos, uma primavera!
Sentia a minha alma suja. E queria lavá-la, queria limpá-la, até ela voltar a funcionar. Teria uma estupidez me quebrado ao ponto de eu já não ser nunca mais (e nunca mais é uma expressão tão terrível para alguém tão novo como eu!) capaz de sentir? Uma coisa que eu esqueci (passado uma infinidade de tempo) assim tão calmamente e sem me aperceber? Ou algo que eu simplesmente enterrei e me esqueci no sentido em que a minha vida se pôs no caminho e me impediu de pensar no assunto?
Porque eu entro em pânico só de pensar. E estas ilusões, estes encontros que tenho tido...? Não quererão dizer nada? Será o Universo simplesmente a brincar com a minha mente? Estarei a enlouquecer? OUTRA VEZ?
Esse nome, aquele nome, já não me diz nada. A mim, que a certa altura pensei que ia ter de morrer para parar de me dizer o que dizia! No entanto, só de pensar em encontrar esse nome por acaso, em ouvir a voz dele ao longe... Por amor de Deus, já ouvi esta música um milhão de vezes e, de cada vez, parece que estalo por dentro, parece que a pessoa destruída que eu era quer sair da parte do meu coração em que a enterrei. Custa-me a ouvir uma música! Custa-me fisicamente! Tenho dificuldade em respirar e volto atrás no tempo.
Que estou eu a dizer? O problema é meu! Eu, que já não sinto nada a não ser que ouça esta e outra música ridícula que eu sempre odiei, mas que desperta em mim a breve lembrança de como eu me sentia a ouvi-la quando era doida e apaixonada. Mas, de resto, a minha vida é um cinzento acutilante, é uma melancolia sufocada.
E eu queria alguém que me lembrasse o que era não ser só teoricamente feliz. Mas não alguém que me fizesse apenas moderadamente feliz e sim doidamente feliz. Ando inconstante: não quero nada banal, não quero nada apropriado para a minha idade. Quero algo épico! Quero que o que me quebrou seja apenas um sopro do vento comparado com aquilo que terei de novo.
Quero não só enterrar o passado, mas esquecê-lo, para sempre. Mas não consigo nada disso, porque mesmo que esteja mesmo à frente do meu nariz a oportunidade de o ter, vou fechar os olhos porque o meu coração está tão incrivelmente fechado que não sente nada!
Enfim... Seja. Venha uma eternidade na ansiedade e na não existência de sentimentos.

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