Saturação

O dia acordou cinzento. Eu acordei cinzenta.
Não, a verdade é que acordei com vontade de rebentar tudo. Por razões desconhecidas. Estou farta de palavras, de sons. Quero silêncio. Para sempre.
A vida devia ter uma botão ''Mute''. Cada som está a fazer-me perder a paciência. E eu não tenho muita.
Quero concentrar-me e não consigo. Quero concentrar-me em escrever este texto e não consigo. Como se escrever já não se tivesse tornado difícil o suficiente com a torrente de pensamentos que tenho. E nunca consigo concretizar nenhum!
Estou farta desta frustração entranhada em mim. Estou farta de sentir o ódio a palpitar debaixo da minha pele. Estou farta de não conseguir escrever, de não conseguir fazer nada!
Estou farta de querer derrubar tudo, de só sentir. Nos últimos tempos só sinto, meu Deus, só sinto!
Estou farta! Estou farta de espelhos para me desiludirem, estou farta de passos na madeira, estou farta de vozes, estou farta de música!
Estou farta de tudo o que seja e o que não seja cinzento, neutro, insensível.
Estou farta de mim, Senhor.
Estou farta deste corpo dorido e inútil, estou farta da minha voz, estou farta desta mente frustrada.
Estou farta da felicidade. Tenho-a sentido intermitentemente e estou farta dela.
Só quero que as coisas sejam como deviam ser. Como estava planeado.
Só quero ser como planeei ser. Só quero algum entusiasmo.
Quero uma vida! Quero a minha vida! Estou farta de ser um autómato. Estou farta de as coisas não estarem nas minhas mãos, de não conseguir controlar tudo!
Estou farta de não conseguir tudo! De não conseguir  nada!
De não fazer a diferença, de não ser como quero!
E quando de facto consigo alguma coisa, é como se não conseguisse. Como se não fosse merecido. Como se fosse indiferente.
E é mesmo isso.
Estou farta de ser indiferente. De estar indiferente.

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