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A mostrar mensagens de junho, 2014

O que será, será.

Os dias passam leves, lentos e simples. Não tenho memória de acontecimento nenhum, porque nenhum acontecimento é digno de memória. A minha mente entrou numa fase de estagnação absoluta, e assim sendo, o passado não existe, o futuro também não. Não me lembro do que fiz ontem, do que fiz na semana passada, no mês passado. Felizmente, também não me lembro, ou lembro-me apenas lassamente e com uma indiferença extrema, do que me gastou no mês passado, no ano passado, numa vida passada. Do que me ofendeu ontem. Não me lembro do que é sentir. Ou, antes, não me lembro do que é sentir seja o que for que não seja esta vaga vontade de me libertar das obrigações, que estão já em contagem decrescente, ou esta resignação alegre da estagnação. O meu ser desistiu de se sentir revoltado, indignado. Desistiu de lutar por um breve período e decidiu hibernar, ou estivar, aliás. Todas as injustiças do mundo ainda lá estarão daqui a umas semanas, todas as minhas causas podem esperar. Toda a teoria sobre t...

O papel do destino

Queridos leitores, Nos últimos tempos tenho-me entregado a várias horas filosóficas. E, assim sendo, achei pertinente perguntar se, de facto, tudo na nossa vida está absolutamente determinado, ao ponto de não sobrar nada que seja da nossa escolha, ou se nós fazemos todas as nossas escolhas. Se, realmente, a nossa vida podia ter sido diferente, conforme alguma escolha que fizemos no passado. Ou será tudo destino...? Por alguma razão (alguma muito irónica razão), prefiro acreditar que foi destino. É mais razoável, menos masoquista, do que considerar a hipótese de eu, por algum pormenor, por alguma palavra que não disse ou que disse, por algum ato que fiz ou que não fiz, poder, neste momento, numa realidade paralela, prosperar. Seria a alternativa a esta realidade melhor ou pior? Ou ambas? Haverá uma multiplicidade de realidades possíveis baseadas nas minhas escolhas? Será tudo completamente aleatório e indiferente? E que papel representará o destino no amor, se é que ele existe e ond...

Rancores filosóficos

Dia 424: Senti-me na obrigação de reabrir este diário. Afinal, sempre que o assunto sobre o qual ele versa era reaberto, fazia sentido reabri-lo também. Assim o fiz durante quase um ano. Até que, a partir de certa altura, percebi que já não precisava de o fazer. Passei a fazê-lo apenas e só quando as saudades me atingiam como um tiro certeiro. Passaram 424 dias. A velocidade a que o tempo passa corrói-me. Afinal de contas, eu lembro-me do dia 1. Eu lembro-me vividamente da semana 1, do mês 1, do ano 1. Lembro-me como se fosse hoje de como morri, vezes e vezes sem conta. Lembro-me como se fosse hoje de não achar que houvesse lugar mais seguro do que a minha cama, o meu quarto. De achar que nunca ia conseguir voltar a levantar-me daquele antro da tortura. Lembro-me de como, de repente, dei por mim sozinha. Não realmente sozinha, mas completamente sozinha, no sentido mental da palavra. Finalmente deu-se uma lucidez cortante na minha cabeça, uma que me mostrou uma realidade cinzenta, em...

Jornada espiritual

O vento gelado entranhava-se nas minhas veias. Os meus olhos só viam escuridão e luzes, abstrato e concreto. O tempo parecia para sempre parado. Caminhei uma noite inteira, à espera de encontrar o que procurava. Caminhei uma noite inteira para saber o que procurava. Mas essa noite não me encheu de nada mais que não tristeza, melancolia. Essa noite não fez mais que me lembrar. Tive o tempo e o silêncio necessários para analisar todos os aspetos da minha vida. No entanto, houve um que não me deixou pensar em mais nada. Ao longo das longas ruas do Porto, eu permiti-me confrontar algumas barreiras. Essas barreiras baseavam-se, então, na minha eterna busca por aquilo que sei, racionalmente, não existir. Achava que estava próximo de o reencontrar. Afinal, tinha definitivamente decidido render a minha alma, a minha mente e o meu corpo, a alguém que saberia o que fazer com eles. Já não tinha medo, achava eu. Pelo menos, não tinha medo disso. Aquela noite enchera-me de outro medo desconhec...

Gasta

Queridos leitores, A partir de certa altura, chega-se a um ponto de exaustão absoluta. O ser humano sente-se tão usado, tão emocionalmente gasto, tão cansado, que parece não ser possível recuperar. Gostava de me poder deitar, adormecer, e nunca mais acordar. Ou, talvez, acordar passados muitos anos, de um sono profundo, pesado, sem sonhos. Acordar após tantos anos que já tudo seja claro como a água, que eu já me tenha esquecido de tudo, que eu me sinta finalmente e novamente, jovem, com sentido, revitalizada. Como se acordasse numa manhã dourada de primavera, quente e fresca, após um longo inverno rigoroso e gelado. Estou tão absolutamente exausta que considero seriamente desistir, fugir, afastar-me. É melhor. Afinal, tenho demasiadas lacunas, demasiadas máculas. Estou demasiado perdida, fui demasiado usada ou traída. Estou demasiado gasta. Todo o meu espírito foi demasiado gasto e usado. Sou um brinquedo já gasto, já velho, com o qual brincaram até me estragar. Depois concertaram...