O Fogo
Dei por mim a fitar um sol encadeante e a respirar um ar fresco que me lembrou velhos verões. Estávamos a meio de um inverno primaveril, que me enchia de esperança quando não havia mais esperança nenhuma. Eram esses dias, os lindos e resplandecentes, que me faziam perceber o quão dizimada me sentia. Em todos os outros dias eu era feliz, equilibrada. Mas nestes dias, com um sorriso de contemplação no rosto a olhar para a paisagem verde e fértil, eu percebia o quão queimada e o quão feita em cinzas eu estava. Essa sensação não me impedia de continuar a ser feliz e equilibrada, apenas me enchia de uma letargia temporária que eu não sabia contornar. O frio acabava por voltar e eu podia voltar a ignorar os meus problemas. Chamar-lhes problemas é um exagero. Não há palavra correta para descrever a sensação de ser uma floresta aniquilada por um fogo que se extinguiu. Há apenas a espera, a longa espera pela regeneração, pela volta à superfície, pelo retorno à realidade. E eu sabia que começa...